Quero Fazer Documentários

 

Você gosta de documentário, ou pelo menos sabe o que caracteriza esse tipo de filme? Uma visão sobre a atualidade, um tratamento criativo da realidade? Ambas as coisas? É o que vamos descobrir neste artigo – em sua essência, também um pouquinho documental.

O documentário é uma prática cinematográfica que está constantemente evoluindo e não tem fronteiras muito claras. Acredita-se que o termo documentary tenha sido cunhado pelo cineasta escocês John Grierson. Segundo ele, o princípio do documentário estava no potencial do cinema para a observação da vida, que poderia ser explorado em uma nova forma de arte. Ele defendia que o ator “original” e a cena “original” seriam melhores para interpretar o mundo moderno do que os elementos que a ficção oferecia. Ou seja, que os conteúdos tirados do “material cru” seriam sempre mais reais do que os encenados.

Já o cineasta soviético Dziga Vertov definiu o documentário como uma apresentação da vida como ela é, capturada sem aviso; ou seja, a vida provocada e surpreendida pela câmera. Outras definições são um pouco menos poéticas, vendo o documentário simplesmente como um filme factual que também é dramático.

Para muitos estudiosos, o documentário se diferencia das outras formas de não-ficção porque oferece uma opinião, uma mensagem específica, junto com os fatos que apresenta. O que todos concordam é que a prática do cinema documental é um processo complexo, que envolve escolhas e problemas criativos, éticos e conceituais. Esse tipo de filme pode ser usado como uma forma de jornalismo, sim, mas também para defender uma causa ou expressar um ponto de vista pessoal do cineasta.

O documentarista norte-americano Michael Moore costuma dizer que não quer que ninguém saia do cinema deprimido depois de assistir seus filmes (que, frequentemente, tratam de denúncias e assuntos preocupantes para a sociedade).

“Eu quero que as pessoas fiquem com raiva. Depressão é uma emoção passiva, raiva é ativa. Esse sentimento talvez queira dizer que 5% ou 10% daquele público vai levantar e dizer: Preciso fazer alguma coisa.”

 

Neste artigo, vamos responder às principais dúvidas sobre a carreira nesta área:

 

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O que faz um documentarista?

O documentarista observa, dialoga e inventa. Ele observa o mundo ou uma situação, se apaixona por um determinado sujeito ou objeto, estabelece estratégias de aproximação e finalmente processa aquele assunto por meio da criação cinematográfica. Em sua produção de conteúdo, o cineasta documental formula seu olhar sobre aquele tema, tendo o discurso audiovisual como ferramenta.

Ao contrário do que muitas pessoas pensam, o documentário não é um registro fiel da realidade. Trata-se de uma construção de linguagem que parte da reflexão do cineasta. O mesmo tema poderia ser passado para diversos documentaristas diferentes e isso geraria filmes completamente diversos, pois a perspectiva de cada um é única.

Um dos aspectos mais interessantes do documentário é a autonomia do criador. O documentarista geralmente faz um pouco de tudo no set. Além disso, é muito raro um documentário em que a ideia inicial não parte do próprio cineasta. Trata-se de um profissional que se apaixona por um assunto e, dominando grande parte do processo da produção cinematográfica, transforma aquilo em um filme, uma construção narrativa que mostre seu ponto de vista sobre o tema.

Qual a diferença entre ficção e documentário?

Para a maioria dos documentaristas, essa distinção é bastante nebulosa. Na verdade, o cinema nasceu como documentário; afinal, os primeiros filmes dos irmãos Lumière, pioneiros do fazer cinematográfico, lá no final do século XIX, retratavam cenas do cotidiano dos franceses da época.

Uma das maiores diferenças entre os dois estilos de filmes é de que o cinema de ficção tem suas responsabilidades éticas, naturalmente, mas no documentário essa responsabilidade aumenta. Por quê? Para um ator, o filme em que ele está trabalhando é apenas isso: um trabalho. Já para o sujeito de um documentário, a filmagem vai acabar, mas a vida continua. Esse “personagem” tem uma experiência existencial com o filme.

Outra diferença é que no documentário você lida com a realidade de uma forma mais intensa, o que inclui as surpresas e decepções que fazem parte do mundo real. O que a realidade apresenta ao documentarista pode fazer parte do filme e enriquecê-lo, mas também podem causar problemas de logística e planejamento.  Na ficção, existe uma possibilidade muito maior de se planejar o que acontece no set, embora também exista espaço para improviso. Só que o controle é muito maior.

Enquanto que na ficção boa parte do que se vê no filme já está previamente estabelecido no roteiro, partindo de alguma coisa que já existe no papel, o documentário é muito mais orgânico. Ele se constrói enquanto está sendo feito: a filmagem busca o imprevisto. Nesse contexto, a pesquisa e a montagem são processos longos e importantíssimos para essa construção.

Recentemente, a cultura do documentário se expandiu e a própria ficção tem usado elementos documentais, misturando linguagens. Para muitos cineastas, a diferença entre os gêneros não importa muito, pois trabalhar conscientemente na fronteira entre as várias formas de explorar a realidade pode enriquecer qualquer tipo de arte.

A única distinção que precisa ser feita, para o artista, é de que o filme seja fiel e potente quanto à sua pretensão artística, que tenha coerência interna de linguagem. O impacto que ele vai gerar no público, no final das contas, vai depender de inúmeras variáveis que estão fora do controle do cineasta.

Dificuldades e desafios

É muito forte a ideia, principalmente para o público brasileiro, de que o documentário é algo pedagógico, didático e, por consequência, chato. Ele pode ensinar algo, claro, mas em geral não é pela via mais simplista ou óbvia. A lição deve vir embutida em uma criação artística, um olhar intenso sobre o mundo, um ponto de vista interessante do documentarista. É preciso recortar a realidade, criando dispositivos que potencializem o que o artista quer falar, entender, mostrar. É sempre um diálogo.

Um consenso entre os documentaristas é de que sempre se sai de um filme sabendo mais sobre o mundo, entendendo melhor a realidade. Entretanto, como essa realidade nem sempre é muito bonita ou agradável, um dos maiores desafios está na maneira como o cineasta – e também os personagens retratados por ele – irão se comportar no meio do “furacão”. O filme nunca é uma linha reta, previsível.

Lidar com a mudança, com situações inusitadas ou inesperadas, pode ser uma enorme dificuldade para muitas pessoas. Para o documentarista, é o que faz a diferença em seu trabalho. Existe um primeiro filme, que está em sua cabeça. Ele pesquisa e descobre que aquilo não é bem assim, o que já transforma a ideia em um segundo filme. Depois de tudo filmado, acaba aparecendo na edição um terceiro filme, totalmente diferente do que o imaginado no início. Deu pra perceber como é dinâmico e interessante esse processo?

Essas transformações radicais, do desejo inicial até a versão final do filme tornam o processo mais desafiador, mas também um pouco incerto. Lidar com o descontrole, o acaso, o imprevisto, é uma das principais qualidades que um cineasta documental precisa ter. São essas dificuldades e novidades que exigem mais atenção, pois elas acabarão conduzindo a narrativa.

Além da responsabilidade com a realidade e das questões éticas que muitas vezes o cinema de ficção não enfrenta, outra grande dificuldade para quem está nessa área é o próprio mercado. É uma carreira que envolve constantes oscilações e o sucesso com o público nas bilheterias muitas vezes demora a chegar, ou nem chega. Claro que cada caso é um caso, mas o profissional de documentário precisa estar preparado para trabalhar por paixão, não por reconhecimento.

Ele também precisa estar disposto a ser tolerante no trabalho em grupo, fazer concessões, ceder, mudar os planos, dividir funções, deixar totalmente o ego de lado, compartilhar e absorver ideias. A ética que se mostrará no trabalho final, que vai para o mundo, é a mesma que começa dentro da equipe.

 

Quais as responsabilidades de um diretor de documentário? Como é o dia a dia de um documentarista?

Isso depende do momento da produção. Na fase de pesquisa, em geral o cineasta se reúne com a equipe de pesquisadores e define as horas e o método de trabalho. Já no momento de gravar, é como se ele saísse do seu mundo, pois se dedica 24h por dia ao projeto – mais ainda se a gravação for em outra cidade ou país. Na edição, o tempo e o envolvimento do diretor (caso ele mesmo não seja o editor do projeto) também variam de acordo com o material captado.

O que o documentarista precisa estar preparado para fazer é estar sempre presente, em todas as fases da produção, e disposto a fazer o que for preciso. Geralmente, ele é quem tem a ideia e participa dela desde a entrevista da primeira fonte até a inserção do último crédito. Com as novas tecnologias e equipamentos disponíveis hoje em dia, é cada vez mais comum o cineasta colocar “a mão na massa” e às vezes até fazer tudo sozinho, explorando novas possibilidades narrativas e realizando projetos extremamente autorais.

Essa ideia de um profissional multifunção pode soar atrativa para alguns, por conta da autonomia, mas o importante mesmo é sentir quais serão os recursos e profissionais necessários, desenvolvendo e aprimorando esses processos, que variam de filme para filme.

O que o trabalho de um documentarista sempre envolve, no entanto, é muita observação, paciência, leitura, pesquisa de campo, de materiais de arquivo. O diretor de um documentário precisa conduzir a história em todos os momentos, pois não existe um manual, uma planilha, uma fórmula, como muitas vezes é comum no cinema de ficção.

Quanto tempo demora cada projeto?

Tudo depende do tamanho da empreitada. Alguns projetos podem ser pesquisados, filmados e editados relativamente rápido – o que, para um longa-metragem, em geral significa alguns meses. Entretanto, a maioria dos documentários, pelo fato de envolverem muita pesquisa de campo, deslocamento e situações da vida real, acabam levando anos para ficarem prontos. Por isso, muitos documentaristas optam por trabalhar em mais do que um projeto ao mesmo tempo, dependendo da fase em que estão em determinado filme.

O importante é ter em mente que quase nunca será um processo rápido e tranquilo, já que o tempo no documentário desempenha um papel importantíssimo; em alguns filmes, o tempo é o próprio sujeito da ação. Por isso, paciência é fundamental.

Essa também é uma grande diferença do documentário e do jornalismo: para o documentarista, é preciso ter uma relação amorosa com o tempo; já o jornalista muitas vezes acaba desrespeitando um pouco o tempo, no sentido de ter que jogar a informação para o público imediatamente, sem se permitir a reflexão que um olhar demorado sobre o conteúdo pode gerar.

Quanto ganha um documentarista?

A resposta padrão de todo documentarista para essa questão é de que tudo varia muito, não existe um parâmetro. Muitas vezes, o projeto é financiado por conta própria, já que é relativamente barato fazer um documentário e quase sempre se trata de um trabalho autoral, embora sempre exista a possibilidade de vender o filme se ele for bem sucedido em festivais.

Editais e leis de fomento também podem ser boas opções para documentaristas, já que muitos contemplam verba de até 1 milhão de reais para longas-metragens de documentário. Já para curtas, normalmente o valor que se pode solicitar fica em torno de 100 mil reais. A divisão dos recursos entre o salário do diretor e as despesas de produção varia de acordo com as demandas de cada projeto, mas normalmente esse cachê não ultrapassa 15% do valor total do filme. No entanto, é possível buscar incentivos de diferentes fontes, o que permite maior autonomia financeira no filme e melhor remuneração para seus realizadores.

Há quem produza material para a internet, o que abre inúmeras oportunidades hoje em dia, ou também para a televisão – nesse caso de conteúdo “sob encomenda”, é bem possível que o ponto de vista do documentarista não esteja tão presente no filme. Mas como se trata de uma área bastante aberta e fluida, existem ainda profissionais que transitam entre a ficção e o documentário, e vice-versa.

Com um orçamento razoável, pode-se ganhar um cachê de 20 mil reais como diretor de um documentário de longa-metragem. Considerando que geralmente o documentarista também produz o próprio filme, ou ajuda na produção, é sempre uma questão de saber negociar e adequar os recursos disponíveis. Contudo, para aqueles que ainda estão começando, que precisam ganhar experiência e habilidade na área, em algum momento acaba sendo preciso trabalhar por meio de incentivos ou “apostar” em um projeto, muitas vezes fazendo parcerias e recebendo valores bem mais baixos – tanto por acreditar na história quanto para “mostrar a cara”.

Como se tornar um documentarista?

Um movimento que tem crescido recentemente é o dos cursos de documentário. No passado, era mais comum pegar a câmera e sair fazendo filmes, curtas e até mesmo longas, ou partir de uma formação ou profissionalização no cinema ficcional para então experimentar o documental.

Estudar, especificamente se aperfeiçoando em documentário, pode ser interessante não apenas para conhecer pessoas com os mesmos interesses, mas para aprender na prática sobre questões logísticas, artísticas e éticas de se fazer documentários. Além disso, o que começa como uma aula com um documentarista reconhecido pode se tornar uma ponte para a sua carreira: se você se destacar, pode ser chamado para a equipe de pesquisa de um filme do seu professor, por exemplo, e dali para seu próprio documentário.

Mas o aprendizado vai muito além disso. A troca de informações é uma das partes mais essenciais de um documentário. Praticar em um ambiente controlado e favorável, sistematizando comportamentos e entendendo o ser humano (que será seu principal “objeto de trabalho”), é uma excelente maneira de começar. Por isso é bom fazer um curso, sim, mas também encontrar um grupo de pessoas com as quais você possa criar, dialogar, mostrar seus trabalhos, compartilhar suas ideias e tirá-las do papel.

Conviver com pessoas, trabalhar na maior quantidade possível de filmes, procurar uma formação teórica e prática. Essas são as bases do documentarista que está começando. A porta de entrada para o documentário deve ser o interesse pelo mundo, pelas coisas que você vê ao seu redor. A observação da realidade é sempre o primeiro passo.

Naturalmente, um curso não vai transformar aluno em cineasta automaticamente e imediatamente. Você precisa ir atrás do que quer falar, usando as ferramentas audiovisuais para contar isso. É uma longa jornada, que começa na descoberta de um assunto que o fascina. A partir daí, existem editais públicos de incentivo à produções documentais. Você pode inscrever seu projeto e conseguir financiamento, ou tentar transformá-lo em uma série para produtoras ou canais de televisão.

Referências e conselhos

    • Para quem busca referências na área, o filme “Cinema Novo”, de Eryk Rocha, é um ode à história cinematográfica brasileira e uma verdadeira aula de documentário.
    • Outro longa brasileiro interessante para quem deseja se tornar documentarista é “Edifício Master”, de Eduardo Coutinho. “Últimas Conversas”, também de Coutinho, traz entrevistas com alunos da rede pública do Rio de Janeiro, sobre suas vidas, seus sonhos e o que almejam para o futuro. Já o filme “Jogo de Cena”, do mesmo diretor, explora um pouco a fluidez entre o cinema de ficção e o documental.
    • O premiado documentário “Cameraperson”, de Kirsten Johnson, mostra o trabalho dela por trás das câmeras. A cineasta usa uma enorme quantidade de material gravado durante décadas ao redor do mundo para construir um panorama do olhar destemido de um documentarista e do poder da câmera.
    • Para aqueles que buscam um bom livro sobre o assunto, “A Dificuldade do Documentário”, de João Moreira Salles, fala sobre o cinema de não-ficção que, para muitos, pode parecer “absolutamente desorientador”, mas que não precisa ser tão difícil assim – afinal, não se trata de um documento da realidade, mas de um diálogo, uma maneira de falar com o público.
    • O principal conselho de quem já trabalha com documentários é saber escutar – tanto uma pessoa quanto uma paisagem. Escutar a equipe, os entrevistados, escutar o tempo. Acolher os fatos com sensibilidade e humildade.
    • Esse interesse pelo outro – mas ao mesmo tempo, ao falar do outro, acabar falando também um pouco de si mesmo – é o que precisa se destacar em um documentarista. Ele tem que estar sempre buscando coisas novas: procurando referências, vendo filmes, estudando, pesquisando, testando, praticando, viajando. Mas, principalmente, precisa saber lidar com gente.
    • Ter esse contato tão próximo com o que muitas vezes é diferente de você, mas que faz parte do mundo que você quer retratar, e encontrar a melhor forma de filmar isso, de expressar criativamente essa ideia, é um trabalho extraordinário.
    • Para o documentarista Michael Moore, a primeira regra do cinema documental é simplesmente essa: não faça um documentário, faça um filme. Se você quisesse fazer um discurso político, poderia se aliar a um partido, organizar um comício. Se quisesse dar um sermão, teria se tornado padre. Se quisesse dar uma aula ou palestra, teria virado professor. Mas, se você escolheu usar a arte do cinema para se expressar artisticamente e contar histórias, simplesmente faça isso!
    • O que fica na tela muitas vezes não é o que o diretor do documentário quer, mas o que tem mais força e impacto para a narrativa. Por isso, futuro documentarista, não queira impor suas ideias. Um filme documental pode levar o artista para caminhos completamente diferentes do que ele imaginou… e isso é maravilhoso!

Leu tudo e se identificou? Confira os cursos de documentário da AIC para iniciar ou se aprofundar na área.

 

* Fontes consultadas para esse artigo, professores da Academia Internacional de Cinema: Bebeto Abrantes e Felippe Schultz Mussel.

**Foto Documentário “Joinha” dos ex-alunos Elizandra Fernandes, Juliana Lima, Maria Thereza Longobardi, Yasmin Thomaz.  Sinopse: O curta-metragem tem como cenário principal um bar que existe desde 1964 no bairro do Tatuapé, em São Paulo.

*** Texto e pesquisa por Katia Kreutz e equipe da Academia Internacional de Cinema

 

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Estopô Balaio

Estopô Balaio, novo documentário de Cristiano Burlan, estreia nos cinemas

estopo balaio, cristiano burlanTudo começou com a professora Ana Carolina Marinho, que dá aulas no curso de Interpretação para Cinema e integra o coletivo Estopô Balaio. Ela quem levou o diretor e professor Cristiano Burlan a ter o primeiro contato com a história e os moradores do bairro Jardim Romano, onde reside o coletivo e Ana atua na peça “O que Sobrou do Rio”, que conta sobre os frequentes alagamentos que acontecem no bairro do extremo leste paulistano, localizado nas regiões de várzea do Rio Tietê. “Aquela história de resistência me estimulou a conhecer melhor o lugar e as pessoas. Passei a visitar o bairro e o grupo sempre com uma câmera na mão. Com esses encontros surgiu a vontade de realizar o documentário”, conta Burlan.

Estreia

Três anos se passaram desde o primeiro encontro. “Estopô Balaio”, o novo documentário do premiado diretor de “Mataram Meu Irmão”, tem sua pré-estreia amanhã (14), às 19h30, no Centro Cultural São Paulo e a estreia oficial acontece quinta-feira, dia 16, no CineSesc, Cine Luiz Segal e no Circuito SPCine em São Paulo (os horários de exibição ainda não foram divulgados).

O Filme

O filme, que encerrou Festival Latino-Americano de 2016 e participou do 40º Festival de Brasília, investiga como a arte opera em situações de trauma social e mostra a interação entre o Coletivo Estopô Balaio e os moradores do Jardim Romano – bairro que ficou submerso por três meses em 2010 – e como eles reinventam sua vida e criam perspectivas de sobrevivência e re-existência.

O coletivo é formado por artistas migrantes de diversas linguagens residentes na cidade de São Paulo que, a partir da experiência pessoal de migração, investiga a memória migrante na cidade de São Paulo através de meios e modos de produção que partem da ideia de teatro documentário e biodrama.

Estopô Balaio

Com o Coletivo de criação, que há cinco anos desenvolve uma residência artística no bairro, nasce um processo de reconstrução de memória social que reúnem artistas, moradores e jovens moradores que vem se formando artisticamente através de atividades de desenvolvidas na sede do coletivo. Além de três peças, criadas a partir de depoimentos dos moradores e suas experiências com as águas, outros processos estão sendo criados, como intervenções urbanas, ensaios de cena na rua, saraus, espetáculos festa, projeção de filmes em espaços públicos e instalações, sempre com o objetivo de trazer os moradores como protagonistas dessas experiências, para que resinifiquem suas memórias.

“Fui criado no Capão Redondo, bairro da zona sul de São Paulo. Com certeza esse trabalho que realizei junto com o grupo Estopô Balaio é um retorno as minhas origens e um diálogo político e social com meu passado”, conta Burlan. “As águas inundam com frequência as casas, as ruas e devastam o cotidiano dos moradores, que são obrigados a reinventar a vida. A arte se alia a esse processo. São todos atores nesse processo de fabular a própria vida. Todos pactuam com o ato teatral”, conta.

Outros Alunos e Professores

Estopô Balaio O filme ainda conta com a participação do também professor Henrique Zanoni, que assina a produção ao lado da professora Ana Carolina Marinho e dos ex-alunos da Academia Internacional de Cinema (AIC): João Macul na Direção de Fotografia, Charlene Rover, Cris Hernandez, Carolina Meneghel, Marcelo Paes Nunes (Montagem), Lucas Negrão, Gabriel Silvestre, Monique Lemos, Bruno Trentin.

FICHA TÉCNICA

ESTOPÔ BALAIO
Direção: Cristiano Burlan
Produção: Ana Carolina Marinho Henrique Zanoni
Fotografia e Câmera: João Macul Cristiano Burlan
Roteiro: Ana Carolina Marinho Cristiano Burlan Marcelo Paes Nunes
Montagem: Marcelo Paes Nunes Cristiano Burlan

Coletivo Estopô Balaio: João Júnior, Adrielle Rezende, Ana Carolina Marinho, Ana Maria Marinho, Bruno Fuziwara, Clayton Lima, Edson Lima, Keli Andrade, Juão Nin, Lisa Ferreira, Paulo Oliveira, Ramilla Souza, Wemerson Nunes, Amanda Preisig e Jhonny Salaberg

Duração: 78min
Ano: 2016
Gênero: Documentário
Distribuição: Bela Filmes 

*Fotos Ramilla Souza, Cristiano Burlan e Ana Carolina Machado

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clermont ferrant

O curta brasileiro em Clermont-Ferrand 2017

No dia 3 de fevereiro, teve início a  39a. edição do Festival Internacional de Curtas-Metragens de Clermont-Ferrand, o maior festival dedicado ao filme de curta duração, onde foram apresentadas as mais recentes produções em mostras competitivas francesa,  internacional,  labo  (dedicada à inovação ) e mostras especiais. Foram 71 programas diferentes exibidos em 16 salas e prestigiados por um  público impressionante de 161.132 espectadores.

O fórum Forcine representou as Escolas de Cinema do Brasil, entre elas a Academia Internacional de Cinema.
O fórum Forcine representou as Escolas de Cinema do Brasil, entre elas a Academia Internacional de Cinema.

O Festival de Clermont-Ferrand recebeu 6173 inscrições para a Mostra Internacional, de 131 países e destes foram selecionados para exibição 75 curtas, entre eles dois brasileiros: “Deusa” e “Estado Itinerante”. Além desses dois curtas, no programa dedicado às escolas, o filme “Caminho de Gigantes”, também brasileiro.

Paralelamente ao festival, aconteceu o 32. Mercado de Filmes Curtos, um espaço de negócios que reuniu representantes de todos os setores mundiais envolvidos com o filme de curta-duração. O Mercado oferece espaço a expositores de todo o mundo para realizarem encontros profissionais em formato de mesas-redondas, fóruns e ateliês, além de uma videoteca que apresenta os filmes inscritos em terminais de vídeo para facilitar acesso de compradores (7374 filmes estavam acessíveis na videoteca do Mercado, entre eles 280 brasileiros). Para que se possa ter uma real visão apresentamos alguns números fornecidos pela administração do mercado: foram 131 organismos presentes representando 35 países. Os acreditados no Festival bateram a marca dos 3500 profissionais. Entre os profissionais frequentadores do mercado estiveram 309 organismos, 98 distribuidores, 525 representantes de festivais, 55 compradores de filmes incluindo VOD e 127 exibidores incluindo TVs e uma companhia aérea, a Air France.

No estande tropical colorido passou muita gente atraída pela cor, pelo exotismo e criatividade de nosso cinema.

O canal de TV Canal Plus, representado por sua Coordenadora Pascale Faure, o programa Court-Circuit Arte, de Paris, através do diretor de programação da Cinemateque Française, Bernard Payen, a Rádio Atitude, canal lusófono de Clermont-Ferrand, com a jornalista Marie de Souza, e a Revista Bref, dedicada ao filme de curta duração, seu Editor-chefe Jacques Kermabon, passaram e realizaram entrevistas buscando saber mais sobre a nossa produção.

Confirma-se o Mercado de Clermont como o lugar ideal para quem deseja conhecer o mundo do curta e veicular e apresentar seus resultados seja em programas de TV, em salas de cinema e festivais e nas viagens aéreas, como entretenimento, como já falamos acima anotando seus números.

O estande foi também base promocional para outros festivais no Brasil, além de do Festival de Curtas de São Paulo, o Curta-Cinema do Rio de Janeiro e o CineFoot. E o forum Forcine, representando as Escolas de Cinema no Brasil, uma delas a Academia Internacional de Cinema.

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Direção de Fotografia

Quero Ser Diretor de Fotografia

*Por Katia Kreutz e equipe da Academia Internacional de Cinema

“Luz, câmera… Ação!” Do famoso clichê tão usado para ilustrar a produção cinematográfica, dois desses itens (luz e câmera) acabam caindo nas mãos da direção de fotografia.

Construir e registrar a imagem que vai aparecer na tela do cinema talvez seja uma das tarefas mais importantes em um filme. Afinal, o que o público vê projetado tem muito do trabalho da direção de fotografia.

 

 

Para um diretor de fotografia, é um momento mágico olhar pelo monitor ou pelo visor da câmera e ver um ator se movimentando na luz que ele criou, através da lente que ele escolheu. É como se a história ganhasse vida ali. Comercialmente, o filme nasce quando é lançado, mas para quem está fazendo ele nasce a cada tomada, a cada plano.

Mas o que exatamente faz esse profissional? Conceitua a parte imagética da história? Opera a câmera, mexe na luz?

Neste artigo, vamos responder às principais dúvidas sobre a carreira de diretor de fotografia:

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O que faz um diretor de fotografia?

A direção de fotografia é a área que controla o processo de construção e registro das imagens de um filme, levando para a tela toda a atmosfera e a linguagem imaginadas na pré-produção, por meio de ferramentas técnicas como iluminação, filtros, lentes, movimentos de câmera, enquadramento, cor, exposição. Uma definição genérica seria dizer que o diretor de fotografia usa a câmera e a luz para transformar as palavras do roteiro em imagens.

Na verdade, essa é apenas uma pequena parte do trabalho desse profissional, embora a função geralmente seja associada a algo mais técnico, por conta do equipamento. Qualquer pessoa que olhe para um set de filmagem verá basicamente isso: as câmeras, os refletores e todo o maquinário da fotografia. Mas o mais importante não é isso. É a ideia que importa.

Então o trabalho de um diretor de fotografia no cinema começa conhecendo o roteiro, seus detalhes e informações narrativas e dramáticas. A partir daí, numa conversa com o diretor (ou diretora), surge um conceito relativo às imagens. Pode-se dizer que esse é um processo herdado das artes plásticas: existe um tema, mas cada artista define como vai representar aquilo conceitualmente.

A fotografia carrega uma mensagem para o público. Isso se constrói junto com a direção do filme, porque é papel do diretor transformar a ideia em matéria. E essa mensagem também é uma escolha: de enquadramento, movimento, cor, luz, exposição. Todo o alfabeto necessário para “escrever” a direção de fotografia está nessas ferramentas.

A questão humana é a base de todo o trabalho. Porque boa parte do que faz um diretor de fotografia envolve a convivência com o diretor do filme, o bom relacionamento com toda a equipe. O aparato técnico deve ser usado para se relacionar com os outros profissionais envolvidos na tarefa de contar essa história e também para “falar” com o público.

Quais as responsabilidades de um diretor de fotografia?

Em um filme de longa-metragem, o ideal é que o diretor de fotografia esteja presente em todas as partes do processo, desde a pré-produção até a finalização. Basicamente, o trabalho do fotógrafo começa ao ler o roteiro e termina quando a cópia de exibição está pronta.

Uma das partes mais importantes do trabalho desse profissional acontece justamente na pré-produção. Seu trabalho é como o de uma orquestra, que precisa passar meses ensaiando para depois se apresentar.

Na pré-produção, algumas das responsabilidades do diretor de fotografia são a pesquisa e o estudo de referências (filmes, fotos, pinturas) para conceitualizar o que funciona melhor e chegar a um consenso visual para a história, além da escolha de equipe, do equipamento, testes, visitas às locações, conversas com a direção de arte, análise da decupagem com o diretor. Essa preparação é praticamente 50% do trabalho.

Por mais que o espectador não veja esses aspectos técnicos (ao menos não conscientemente), é o conceito que vai fazer com que ele sinta algo. O filme não deve invadir, mas carregar o público. É claro que os elementos técnicos são indispensáveis, mas apenas para que se consiga passar essa essência que o expectador vai sentir. Por isso o cinema é tão complexo: ele atinge o público em vários níveis.

Quando a equipe chega ao set de filmagem para a gravação, é hora de realizar o que foi pensado. Existe uma energia ali, por estarem todos concentrados, em silêncio, com a atenção voltada para os atores. Claro que existe espaço para improvisos, mas é a hora de executar tudo o que foi planejado, transformar aquela ideia em algo concreto, em matéria. Sim, porque até chegar ao local de filmagem e montar a luz, ligar a câmera e colocar os personagens para falar e agir, tudo é apenas uma ideia.

Então, na fase de filmagem, o trabalho relativo à iluminação, ao controle de tempo, à movimentação de câmera, maquinário, enquadramento, composição e mesmo a liderança da equipe de cinematografia são algumas das principais responsabilidades do diretor de fotografia.

Apesar de a tecnologia digital ter facilitado um pouco a questão de alterar ou corrigir detalhes na pós-produção, o ideal é que a fotografia de um filme já saia pronta do set de filmagem. É naquele momento que as coisas estão todas alinhadas: atores, direção de arte… Hoje em dia até é possível alterar um pouco a imagem na pós-produção, mas mesmo nesses casos tudo precisa ser muito bem pensado na captação – como foi o caso do filme “O Regresso/The Revenant”, de Alejandro González Iñárritu. O contraste, a direção da luz e a atmosfera são criados no set, por isso deixar para fazer esse trabalho na pós muitas vezes gera um resultado diferente do esperado, com imagens de aspecto “falso”, que não combinam com as já captadas. Esse tipo de intervenção também demora muito tempo, além de encarecer o projeto.

Mas e quanto à participação do diretor de fotografia na fase de finalização? Quer dizer que, uma vez desligada a câmera, ele não participa mais do filme? Tudo depende do diretor, mas é fundamental que o fotógrafo participe também dessa fase. Não por ego profissional, apenas porque a responsabilidade pela imagem do filme é dele.

A pós-produção ajuda a completar o processo da captação, já que as imagens “cruas” não são necessariamente bonitas, mas “saltam” durante o processo de correção de cor (color grading). Ter consciência e saber utilizar essas ferramentas hoje, conhecer minimamente as possibilidades, também faz parte da direção de fotografia. Assim como um eletricista dá ao fotógrafo soluções para luz, o colorista dá soluções para a imagem na pós.

Quando o fotógrafo está com o diretor até o filme ficar pronto, suas tarefas incluem participar nesse processo de correção de cor, no ajuste fino das imagens, e fazer os testes de projeção. O trabalho desse profissional só acaba, de fato, quando a cópia de exibição do filme está pronta. Uma cópia consistente, que transmita todo o trabalho que ele e sua equipe passaram meses conceituando e realizando.

Como é o dia a dia de um diretor de fotografia?

Uma coisa é possível dizer sobre a rotina (nada rotineira) de um diretor de fotografia: não dá pra ter preguiça de trabalhar. Principalmente quando se está filmando, é preciso acordar cedo, ficar várias horas em pé, carregar (ou ajudar a carregar) equipamentos pesados, ter muita paciência e atenção, lidar com diretores exigentes e que mudam de ideia com frequência.

Certamente é um trabalho que cansa, que exige uma carga de concentração absurda e não tem muito do glamour que as pessoas imaginam, vendo as coisas de fora. Num filme, muitas vezes os profissionais envolvidos não entregam somente sua força de trabalho, mas sua emoção, sua sensibilidade.

Por outro lado, tem o lado interessante nisso: quem participa da filmagem de um longa-metragem, de certo modo, vive outra vida. Mesmo quando a gravação acontece na cidade onde as pessoas da equipe moram, quando elas chegam no set, é como se entrassem em outro universo, outra dimensão.

Quanto tempo demora cada projeto?

Pode parecer uma resposta vaga, mas realmente depende do projeto: se é um curta ou longa-metragem, documentário ou ficção… O ideal, no caso de um longa de ficção, seria que o diretor de fotografia entrasse no processo de conceitualização do filme pelo menos um mês antes da filmagem. Em média, o período de filmagem, nas produções cinematográficas nacionais, dura entre um mês e um mês e meio.

No caso de um documentário, tudo depende muito da agenda dos entrevistados. Às vezes a gravação pode ser feita em várias etapas, dependendo também da verba, da necessidade de viajar. Alguns filmes levam anos para serem completados, mas o tempo padrão é de alguns meses para pré-produção, produção e montagem/finalização.

 

Checklist – Responsabilidades do Diretor de Fotografia

Faça o download do Checklist de Responsabilidades do Diretor de Fotografia


 

Quanto ganha um diretor de fotografia?

Essa é uma dúvida muito natural quando se está decidindo investir tempo e dinheiro em uma carreira. Antes de responder a pergunta, vale lembrar que é um pouco arriscado dar muito peso para esse fator.

 

Em qualquer carreira, existem oportunidades de crescimento e de remuneração em diferentes níveis. O que vai fazer você crescer profissionalmente é a sua dedicação, vocação para a área e experiência, além de um pouquinho de sorte.

 

Agora, respondendo à pergunta: quanto ganha um diretor de fotografia? Isso depende do projeto, do tamanho da produção. Uma maneira de ter uma base é observar a tabela do Sindcine, que estabelece como valor de cachê para um diretor de fotografia cerca de 2500 reais por semana. Ou seja, para um longa-metragem, com duração de um a dois meses, o salário mensal seria em torno de 10 mil reais. Num curta-metragem, a média fica entre 3 e 5 mil reais para o projeto inteiro (que normalmente dura entre uma e três semanas). Já na publicidade, muitas vezes o valor pago em apenas uma diária do profissional é de 3 mil reais. Sentiu a diferença?

No caso de uma produção totalmente independente, muitas vezes é difícil seguir tabelas de sindicatos. Alguns fotógrafos começam trabalhando por muito pouco, assim como todo o resto da equipe, se acreditarem em uma ideia, se aquela for uma história que eles queiram contar.

Ok, mas dá pra viver de fotografia? A resposta é sim, porém é necessário escolher bem os projetos e ter uma boa organização financeira para conseguir se manter entre um trabalho e outro. O sucesso nessa carreira, como em qualquer outra, depende de um trabalho consistente, competência e dedicação. Reconhecimento é algo que se conquista, com muito trabalho e estudo.

A formação profissional em direção de fotografia abre um enorme leque de possibilidades, já que existem diversas carreiras relacionadas a essa área no universo audiovisual, que muitas vezes são etapas para se chegar ao cinema. Você pode trabalhar com televisão, internet, publicidade. Pode começar como assistente de câmera e ir subindo os degraus até a direção de fotografia cinematográfica.

Naturalmente, a maioria das pessoas precisa começar de baixo, e como em todas as áreas, cada profissional vai se encontrando e se estabilizando em diferentes degraus de atuação e de remuneração. Se você chegar a figurar entre os cinco maiores diretores de fotografia do Brasil, sua remuneração será igualmente alta.

Mas e se eu não chegar a esse nível de reconhecimento? Não é necessário estar entre os cinco maiores diretores de fotografia do Brasil para que essa seja sua profissão e principal fonte de renda, e conforme você adquire experiência os rendimentos tendem a crescer. Sua carreira precisa ser construída dentro das oportunidades que surgirem – sejam elas trabalhos como autônomo para vídeos institucionais, publicidade, casamentos, YouTube, ou mesmo algo fixo em uma emissora ou produtora de cinema ou TV.

Embora, em grande parte dos casos, não seja possível ter carteira assinada e plena estabilidade no que diz respeito ao salário, também não existe rotina. Trata-se de um trabalho interessante, em que tudo muda constantemente, sempre com algo novo para criar e aprender. Além disso, a (falta de) rotina de um freelancer exige mais do profissional, é algo desafiador. É preciso ter mais iniciativa, melhorar e crescer constantemente. Mas são esses desafios também que fazem as pessoas terem energia e vontade de fazer cada vez mais.

Como se tornar um diretor de fotografia?

Existem diversas maneiras de ingressar na carreira. Em primeiro lugar, é preciso ter responsabilidade e competência. O  networking é muito importante, mas só funciona no cinema – assim como em qualquer outra área – se o profissional for bom, pois ninguém vai deixar um filme com orçamento de 4 milhões de reais na mão de um profissional inexperiente só porque ele é amigo de alguém.

No Brasil, o curso de carreira mais clássico no mercado costumava seguir uma hierarquia que começava no video assist, passando para segundo assistente de câmera, primeiro assistente de câmera, até eventualmente chegar ao cargo de diretor de fotografia.

Com o boom das câmeras digitais, as coisas mudaram um pouco. Esse sistema de “escadinha”, num mundo em que todos têm acesso a equipamentos desde cedo, acabou sendo substituído pelo bom e velho “aprender fazendo”. Estudando, lendo, testando, às vezes observando o trabalho dos outros…

Uma dica para quem pretende ingressar na profissão é investir em estudo. Um curso ou faculdade facilita conhecer pessoas, praticar e se especializar. É muito saudável essa troca de contatos e amizades num curso de cinema, em que todas as pessoas estão ali com a mesma vontade e foco, entrando no mercado de trabalho juntas e muitas vezes formando parcerias para uma vida toda.

Mas não seria melhor investir esse dinheiro na compra de uma câmera, ao invés de pagar um curso? Até mesmo do ponto de vista mercadológico e financeiro, comprar um equipamento sem saber o que fazer com ele é um péssimo negócio. Por que usar seu dinheiro em um objeto que vai se defasar, se você pode investir em si mesmo, no seu conhecimento? Também é possível que você acabe comprando o equipamento errado, isso sem contar o fato de que projetos diferentes exigem equipamentos diferentes. Mesmo em grandes produções e empresas, o mais comum é alugar não comprar.

Hoje em dia, em escolas de qualidade, os alunos filmam projetos no decorrer de seus cursos e realizam aulas práticas, exercícios, curtas-metragens. A própria AIC é assim, possibilitando colocar a mão na massa e aprender fazendo. Por isso, ao avaliar uma escola ou faculdade, sempre pergunte qual o número de projetos que serão realizados e a quantidade de atividades práticas, bem como o grau de autonomia e responsabilidade que o aluno tem nessas atividades, buscando se informar também se os professores são profissionais ativos no mercado audiovisual.

Você sempre pode comprar sua câmera depois. O que não funciona é comprar primeiro e aprender depois, porque você provavelmente vai desconhecer o mais importante da arte cinematográfica, que é construir a narrativa.

Claro que, nos dias de hoje, qualquer pessoa pode entrar na internet e pesquisar tudo sobre o trabalho de um diretor de fotografia, ver making of de filmes, ler tudo sobre os mais variados tipos de câmeras e lentes… Mas essa teoria acaba chegando fragmentada, e muitos sites publicam informações erradas ou simplificações. Na escola, há um espaço de aprendizado. Existe direcionamento, mas liberdade criativa, sem a responsabilidade de uma produção profissional.

Além disso, não se faz um filme sozinho. Então o jeito é ir atrás de outras pessoas que estão fazendo cinema. Afinal, não vai cair um longa-metragem no seu colo. A vantagem de estudar é que esse ambiente oferece aos iniciantes equipamento, convivência com os futuros colegas de trabalho e orientação de pessoas mais experientes.

A primeira pessoa que vai te ajudar na carreira pode ser um ex-colega de sala que entra em uma produtora, ou um professor que chama o aluno para ser terceiro assistente de um longa. As redes de contatos começam na escola e se expandem a cada projeto realizado.

É muito comum as pessoas crescerem juntas nesse mercado. Filmes de sucesso projetam todos os profissionais para níveis mais altos. Um curta feito em sala de aula que ganha um festival traz visibilidade para toda a equipe. Assim, o networking se expande e começa a trazer oportunidades cada vez maiores e mais interessantes. Tudo isso exige, não apenas que se conheça as pessoas certas, mas que o profissional cumpra suas funções direitinho e nunca pare de desenvolver suas habilidades, de evoluir como artista.

Película vs. digital

Vivemos em uma realidade em que o que mais importa é a velocidade, a tecnologia, o imediatismo, o avanço. A película, antes a principal ferramenta de trabalho do diretor de fotografia, acabou se tornando algo quase nostálgico. No Brasil, hoje, é muito difícil trabalhar com formatos analógicos. Na verdade, financeiramente ainda seria viável, mas não temos mais infra-estrutura de pós-produção em película, o que torna esse processo muito caro, já que o negativo precisa ser revelado e telecinado (digitalizado) fora do país.

Se por um lado a tecnologia digital democratizou as coisas e permitiu inúmeras possibilidades para quem está ingressando no mercado, o processo de fazer, refazer, testar, experimentar e muitas vezes errar também faz parte do desenvolvimento profissional. Porém, o cuidado com a imagem deve ser o mesmo que havia nos tempos da película. O pensamento da “importância daquele momento” precisa continuar.

Dificuldades e desafios

A tecnologia digital não precisa ser uma desculpa para ter preguiça, só porque tudo está aparentemente mais fácil e acessível. É ótimo que esteja mais fácil, porque assim é possível, cada vez mais, colocar a mão na massa. No entanto, é preciso sempre lembrar que a facilidade de filmar não quer dizer que qualquer um por aí seja diretor de fotografia, pelo simples fato de ter uma câmera.

Essa distorção de valores faz com que as pessoas acabem dando um “pulo na carreira”, pelo menos na teoria, sem terem de fato os conhecimentos mais básicos da cinematografia. Nesse sentido, quem está começando precisa agir com humildade e curiosidade, por mais que possua os melhores equipamentos do mundo, porque essa é uma arte que se aprende depois de muitas horas no set e muitos anos (sim, anos!) de experiência.

Podemos usar a analogia de um piloto e as horas de voo: quanto mais horas de prática ele tiver, além de familiaridade com os equipamentos, mais seguro estará para voar. No caso do diretor de fotografia, conhecer o equipamento não quer dizer necessariamente no sentido de operar, mas de saber quais possibilidades existem no uso da luz, da câmera, da cor, do tempo, do movimento, para contar uma história.

Referências e conselhos

Para quem quer saber um pouco mais sobre o trabalho de um diretor de fotografia no Brasil, um excelente filme é o documentário de longa-metragem “Iluminados”, de Cristina Leal (disponível na íntegra no YouTube). O longa revela o olhar sobre a fotografia de cinema pelas lentes de alguns dos maiores profissionais da recente cinematografia brasileira: Dib Lutfi, Edgar Moura, Fernando Duarte, Mario Carneiro, Pedro Farkas e Walter Carvalho.

Outra dica é “Luz & Sombra – Fotógrafos do Cinema Brasileiro”, uma série documental que aponta suas lentes para aqueles que estão por trás das câmeras. Cada episódio mostra a trajetória de um importante fotógrafo cinematográfico, suas experiências e os filmes que marcaram sua carreira.

No longa norte-americano “Visions of Light – The Art of Cinematography”, dirigido por Arnold Glassman, Todd McCarthy e Stuart Samuels, profissionais de câmera discutem a arte da cinematografia e o trabalho do diretor de fotografia, ilustrando suas falas com clips de longas conhecidos.

 

 

O filme “Cinematographer Style”, de Jon Fauer, também traz alguns dos maiores cinematógrafos do mundo para falar sobre sua arte, explicando como e por que usaram determinadas linguagens visuais em seus filmes.

“Cameraman: The life and work of Jack Cardif”, com direção de Craig McCall, é um filme que fala sobre uma época mais artesanal da direção de fotografia, em que efeitos especiais eram criados na prática, por meio de perspectiva. O documentário é interessante para conhecer como era o processo da direção de fotografia no cinema no passado.

“Writing with light: Vittorio Storaro”, dirigido por David Thompson, fala sobre esse que é um dos maiores diretores de fotografia do cinema italiano e do mundo. Já o filme “No Subtitles Necessary: Laszlo & Vilmos”, conta um pouco da trajetória de dois grandes amigos e diretores de fotografia, os húngaros Laszlo Kovacs e Vilmos Zsigmond, e como seu trabalho impactou o cinema norte-americano.

Com tantas referências sobre a profissão, resta apenas dizer que o maior conselho de quem já tem experiência na área é trabalhar com dedicação, profissionalismo e humildade. Observar outros profissionais mais experientes ou, se possível e ainda melhor, começar atuando como assistente de câmera.

Paralelamente, é essencial expandir os conhecimentos e se atualizar sempre, num mundo digital que muda constantemente e traz novas tecnologias todos os dias. E nunca parar de exercitar a imaginação, que é uma das primeiras coisas necessárias a um diretor de fotografia, quando ele pega um roteiro nas mãos.

Vale lembrar que a direção de fotografia não é um trabalho somente técnico, mas que requer domínio da criatividade conceitual e narrativa. Não é algo mágico, mas que faz parte da construção da magia do cinema. Muitas pessoas buscam o fazer cinematográfico por serem cinéfilas, e muitas também acabam se frustrando com a realidade difícil do set de filmagem.

É muito prazeroso e fascinante, fazer cinema. Mas também é extremamente exaustivo: trabalha-se diversas horas seguidas, tudo é muito intenso, a pressão é enorme. No momento em que a câmera começa a rodar, todos ficam em estado de alerta, e essa tensão vai se acumulando no seu corpo, seu emocional.

O fotógrafo, de certa maneira, é uma das pessoas que mais se movimenta no set – antecipando, resolvendo e pensando no próximo take, “pilhado” o tempo inteiro. Dentro desse contexto, a parte mais complexa é a relação humana, porque não somos máquinas produzindo filmes. Não basta simplesmente ligar a câmera e pronto. O cinema é uma expressão de pessoas para outras pessoas. O processo criativo requer empatia, conexão. Por isso, quanto mais você filma, quanto mais convive com outras pessoas, mais aprende.

Quando a gravação de um filme acaba, muitos profissionais dizem que parece que você está se separando de uma família – por mais piegas que isso possa soar. Essas pessoas viajaram juntas para um “outro mundo”, uma história única. É essa relação de respeito e confiança que se espera de uma equipe de filmagem.

Afinal, já é tudo tão cansativo e estressante, as pessoas precisam tomar inúmeras decisões e correr contra o tempo. Se estiverem em uma externa, a luz acaba, tem horário. Os atores erram, cansam, o diretor quer improvisar… Se não houver uma boa relação, principalmente entre o diretor e o diretor de fotografia, isso atrapalha o trabalho de todos. O ambiente tenso passa pra equipe, ninguém consegue se concentrar. Então fica aqui nossa recomendação: busque crescer tecnicamente, criativamente, mas também nas relações humanas.

É a convivência nas diversas partes do processo, em especial no set de filmagem, que forma um diretor de fotografia e sua visão de mundo. Mesmo em um filme de entretenimento, sem pretensão de discutir algo mais profundo, ele pode contribuir com uma linguagem, uma atmosfera ou estética interessante. Esse é o poder da luz e da câmera para a ação.

Leu tudo e se identificou? Confira estes cursos de direção de fotografia para iniciar ou se aprofundar na área.

 

* Fontes consultadas para esse artigo, professores da Academia Internacional de Cinema: André Moncaio, André Besen e Cleumo Segond.

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wagner moura AIC, merighella

Wagner Moura conta sobre sua estreia como diretor em filme sobre Marighella

wagner moura na AIC fala sobre Merighella
Com estúdio cheio, o ator contou sobre sua estreia como diretor em filme sobre o guerrilheiro Marighella

Wagner Moura esbanja carisma e desperta um certo frenesi por onde passa. O ator chegou cedo na Academia Internacional de Cinema do Rio de Janeiro (AIC), no último dia 16 e, sem nenhuma cerimônia, sentou-se ao lado do público para assistir ao filme “Cidade Baixa”. Ele não via o longa desde 2005, quando o título foi lançado, por isso quis assistir novamente. Quando começou o bate-papo disse que ficou mexido: “Fiquei muito emocionado de rever ‘Cidade Baixa’, quero que meu filme, sobre o Marighella, tenha essa mesma energia vital”, disse.

Estreia na Direção em filme sobre Marighella

Com mais de 20 filmes no currículo, muitas séries e algumas novelas, Wagner Moura dispensa apresentações. Mas, o que pouca gente sabe, é que o ator se prepara para sua estreia como diretor. Em setembro ele dirige seu primeiro longa, um filme de ficção sobre o guerrilheiro e inimigo número um da ditadura militar, Carlos Marighella, baseado no livro do jornalista Mário Magalhães.

Durante o bate-papo na AIC, que fazia parte da programação da 12ª Semana de Orientação, Wagner falou sobre o filme, que ainda está em fase de pré-produção, sofrendo ajustes finais no roteiro.

Amigo de Maria Marighella, neta do militante comunista, o ator diz que sempre sentiu muito interesse pela história de Marighella. “Tudo começou pela vontade de devolver a história para um personagem tão importante. Sinto imenso interesse por pessoas que lutaram e resistiram à ditatura. Além da grande história, ele também é baiano, como eu, e um personagem instigante que tem um lado que poucos conhecem, ele não era um guerrilheiro clássico como Luiz Carlos Prestes ou Che Guevara, ele era uma figura interessante, poeta, engraçado, tinha muito senso de humor e um lado sedutor”, conta Wagner.

Consciente de que escolheu um tema difícil para sua estreia, quer que o processo de feitura do filme seja de muito aprendizado. Contagiado pelo cinema de José Padilha, Wagner pretende fazer um filme de ação e deseja que o filme seja popular e atinja o maior número de pessoas possível.

Acredita que dirigir, depois de tanto atuar, foi algo orgânico, que aconteceu naturalmente. “Sempre tive curiosidade de saber o que acontece além das cenas vividas pelo ator. Foi por conta dessa curiosidade que aos poucos entendi a função de cada um no SET, acho que a direção surge de forma natural”.

Referências e Influências

wagner moura na AIC fala sobre Merighella

Questionado sobre suas maiores referências, Wagner traz à tona uma dezena de nomes do cinema nacional e destaca algumas parcerias. “Tenho muitas, mas acho que as mais fortes e presentes são o meu amigo e irmão Lázaro Ramos, o Zé Padilha, pelas suas escolhas estéticas e políticas e o diretor Karin Aïnouz, todos eles grandes profissionais com quem aprendo sempre”, elogiou o ator ao contar que mandou o roteiro do filme para os dois diretores.

“Se tem uma coisa que eu gostaria é conseguir dirigir o meu filme com o que eu aprendi com cada um deles”. E brincou, “Imagina conseguir juntar a sensibilidade e a poesia dos filmes do Karin com o cinema político de ação do Padilha? Nossa, eu seria o diretor mais foda do mundo”, falou arrancando risos da plateia.

Aproveitando os risos, emendou mais uma piada entre ele e o amigo, o diretor José Padilha: “Quando perguntei para o Zé se ele achava que eu teria capacidade para dirigir ele me respondeu: cara, tendo um bom roteiro, bons atores e uma boa equipe, qualquer um dirige um filme”.

Todo personagem é desafiador

wagner moura na AIC fala sobre MerighellaWagner falou sobre sua carreira e atrela sua ascensão no cinema à sorte, já que veio para o Rio em um momento de retomada do cinema nacional. “Viemos eu, Lázaro (Ramos) e Vladimir (Brichta) da Bahia, no final da década de 1990 e estávamos em cartaz com a peça ‘Máquina’ e o cinema estava buscando rostos diferentes dos que estavam na televisão. Buscando uma identidade”, conta.

O ator contou que aprendeu muito em um dos seus primeiros filmes, “Em ‘Deus é Brasileiro’ recebi muitas dicas e aprendi muito com os câmeras, que me ensinavam a atuar no SET, representar para a câmera e sair da forma do teatro”.

Sobre preparação de atores, Wagner acha que toda ajuda é sempre bem-vinda, seja da equipe, do diretor ou de um preparador de elenco. “Nós atores temos o péssimo hábito de culpar o diretor quando o nosso trabalho não fica bem feito. A gente tem a obrigação de criar, de fazer bem o nosso trabalho, de dar o melhor de si, sempre, independente da preparação ou da direção”.

Qual o personagem mais desafiador que já fez? Ele é enfático ao dizer: TODOS. “Tudo que eu faço eu acho que é a coisa mais difícil da minha vida e me empenho muito para me superar. Artista tem que ter coragem, não pode se esconder”.

Wagner fala ainda que para cada personagem existe um processo de pesquisa, de estudo, de criação etc. Para viver Pablo Escobar em “Narcos” ele se mudou para a Colômbia cinco meses antes de começarem as gravações e estudou espanhol além de muita história do país. Já em “Tropa de Elite” foi um processo de muito improviso onde muitas cenas foram criadas na hora.

wagner moura na AIC fala sobre Merighella“O instrumento do ator é o próprio corpo. O nosso trabalho acontece no nosso corpo e o grande lance é que o corpo tem memória. O corpo não sabe que você está interpretando. Você faz uma cena forte e depois vai tomar um copo de água e percebe que sua mão está tremendo. Você dá informação para o seu corpo e ele não sabe que tudo aquilo é mentira. Então aquilo tudo fica em você. Por isso os personagens afetam sim, e muito, a vida do ator”, conta Wagner.

Diferenças entre atuação para Teatro, TV e Cinema

Ainda sobre atuação, Wagner fala um pouco sobre as diferenças entre atuar em teatro, televisão e cinema: “O teatro é uma labuta diária, é todo dia fazendo todas as cenas com veracidade. A TV é ágil, não dá tempo para o ator errar. Ainda mais agora que a TV Globo aumentou muito a qualidade do que produz, que ela se deu conta de que precisa produzir para concorrer com os canais pagos, com o Netflix. Já o cinema a gente tem um pouco mais de tempo. O cinema é um grande processo. ”

Wagner finalizou contando um pouco sobre as diferenças de atuar aqui no Brasil e fora do país, sobre seu engajamento político e o compromisso do artista com a sua arte. Deixou o estúdio da AIC só por conta do horário que teimava em avançar no relógio, pois, se dependesse dos participantes e de suas perguntas afiadas, ficaríamos ali o resto da noite aprendendo com os ensinamentos do grande ator e curtindo suas histórias.

*Crédito fotos: Ricardo Aleixo

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