A parceria entre a Academia Internacional de Cinema (AIC),aEscola de Artes da Universidade de Columbia e o Columbia Global Centers | Rio de Janeiro traz para Brasil o ex-diretor de programação da Film Society do Lincoln Center e do Festival de Cinema de Nova York, Richard Peña, para a aula aberta e gratuita: Inventado o Cinema Independente – uma celebração de Maya Deren. O evento acontece dia 28/08 em São Paulo e dia 30/08 no Rio de Janeiro.
A parceria inédita entre AIC e Columbia inaugura uma série de possíveis palestras e eventos futuros.
“Maya Deren é a ‘avó’ do cinema independente americano e do cinema da vanguarda”, diz o professor Richard Peña, que ministrará aula aberta e gratuita na AIC. Crédito foto: Ulysse del Drago
Inscrições encerradas.
Professor da Escola de Artes da Universidade de Columbia em Nova York desde 1989, Peña é fluente em português e apaixonado pelo Brasil. Trabalhou como Diretor de Programação da Film Society do Lincoln Center e como Diretor do Festival de Cinema de Nova York de 1988 a 2012. Na Film Society, ele organizou retrospectivas de grandes diretores como Michelangelo Antonioni, Sacha Guitry, Abbas Kiarostami, Robert Aldrich, Gabriel Figueroa, Ritwik Ghatak, Kira Muratova, Youssef Chahine, Yasujiro Ozu, Carlos Saura e Amitabh Bachchan.
Inventando o cinema independente: uma celebração de Maya Deren (1917-1961)
Em tempos de discussões férteis sobre a participação feminina no cinema e após o painel “Mulheres no Cinema” realizado na última semana na AIC, a palestra de Peña celebra o centenário da diretora Maya Deren e seu cinema independente que até hoje influencia cineastas.
“Maya Deren é a ‘avó’ do cinema independente americano e do cinema da vanguarda. Seu filme, MESHES OF THE AFTERNOON, é reconhecido como a primeira verdadeira obra da vanguarda no cinema americano. Além de cineasta, Deren era poeta, dançarina e militante política. Na masterclass farei uma introdução a toda atividade dela e mostrarei três de seus filmes”, conta Peña.
Instigantes, enigmáticos e provocativos, os curtas de Maya Deren estão entre os tesouros do cinema americano. Atraída pela política radical da era da Depressão, Deren atuou como militante até se dedicar à poesia, à dança e depois à fotografia, tornando-se parte da cena artística boêmia de Nova York.
A palestra explorará a vida e as conquistas de Maya Deren, selecionando e analisando três de seus filmes Meshes of the Afternoon, At Land, A Study of Choreography for the Camera, contextualizando sua arte e seu trabalho no cenário da América do Pós-Guerra.
SERVIÇO
Masterclass com Richard Peña na AICSP
28/08 (segunda-feira) às 19h30 Rua Dr. Gabriel dos Santos, 142, Higienópolis – Tel.: (11) 3660-7883 Capacidade do local: 120 pessoas (evento sujeito à lotação do espaço – chegue cedo para garantir seu lugar)
Masterclass com Richard Peña na AICRJ
30/08 (quarta-feira), às 19h30 R. Martins Ferreira, 77, Botafogo – Tel.: (21) 2537-8183 Capacidade do local: 90 pessoas (evento sujeito à lotação do espaço – chegue cedo para garantir seu lugar)
A Semana de Cinema e Mercado (SCM) da Academia Internacional de Cinema (AIC) reiterou a ideia de que muito ainda precisa ser feito para ampliar a presença feminina no universo (masculino) do audiovisual. Dedicado ao cinema feito por mulheres, o Painel “Mulheres no Cinema” reuniu grandes nomes e gerou um debate caloroso e necessário trazendo à tona números da produção nacional. Em São Paulo o debate foi mediado pela diretora assistente e produtora Lara Lima e composto pela diretora Jéssica Queiroz, a atriz americana Britt Harris e a roteirista e diretora Maria Clara Escobar. No Rio de Janeiro as convidadas foram a distribuidora Priscila Miranda, a diretora de fotografia Andrea Capella e a diretora do Festival Internacional de Cinema Feminino, Paula Alves.
Mulheres de diferentes áreas que de uma forma ou de outra encontram pontos em comum em histórias envolvendo sexismo e assédio em seus ambientes de trabalho. O lado bom de tudo isso são os coletivos que surgem com a intenção de aglutinar e organizar profissionais mulheres e transgêneros como o Coletivo das Diretoras de Fotografia do Brasil (DAFB), do qual Andrea Capella faz parte, com a intenção de fortalecer, estimular e ocupar a participação das mulheres em espaços que naturalmente não são habitados por elas.
Maria Clara Escobar começou ressaltando que mesmo com todas as dificuldades enfrentadas é importante lembrar do lugar privilegiado que ocupa. “Sou privilegiada por estar viva, ser branca e fazer cinema. Demorei bastante tempo para pensar profundamente sobre meu lugar, de poder transitar por qualquer espaço. Aliás, essa é uma questão importante, esse lugar imaginário e subjetivo que a gente ocupa. De como somos domadas e não vemos outras possibilidades de lugares. Estou nesse momento, um exercício constante de descolonizar a mim mesma e fazer esforços para trabalhar mais com mulheres”.
Presença Feminina no Cinema Brasileiro
Paula Alves, doutoranda na questão da presença feminina no cinema, fez uma média de dados encontrados no site Filme B e em relatórios do Observatório Brasileiro do Cinema e do Audiovisual (OCA – Ancine) e trouxe os números: dos longas-metragens produzidos entre 2001 e 2010 3% foram fotografados por mulheres, 15% dirigidos, 14% roteirizados, 24% produzidos e 18% protagonizados. Já entre 2012 e 2014, apenas 6% dos filmes tiveram a direção de fotografia feita por mulheres, 23% trabalharam em cargos de produção, 17% com montagem, 13,5% no roteiro, 15% na direção e 16% protagonizado filmes.
Na pesquisa Presença Feminina no Audiovisual Brasileiro, apresentada por Debora Ivanov no Rio Content Market de 2016, das 2606 obras (entram ai, além do cinema, documentários, ficção, vídeo musical, variedades, animação e reality shows) apenas 19% foi dirigido por mulheres, 23% roteirizado e 41% das obras contaram com mulheres trabalhando na produção executiva dos projetos.
Jéssica Queiroz lembra que os números são quase inexistentes quando falamos de mulheres negras no cinema. “Além da barreira de ser mulher, sou negra e periférica. Comecei a trabalhar em agencia de publicidade e até hoje preciso dividir o meu tempo entre os meus filmes, meus projetos e bater cartão de segunda a sexta em agencia de publicidade. É importante comentar que dos últimos 200 filmes lançados no Brasil, segundo números de 2015 da Ancine, 84% deles foram feitos por homens brancos, 16% por mulheres brancas e nenhum por mulheres negras. E o pior é que isso não é nem questionado nas escolas e em nenhum outro lugar. Sem contar na forma como somos retratados, só aparecemos no Favela Movie como pobres ou bandidos. Nunca somos protagonistas da nossa história. É preciso repensar nesse modelo e principalmente agir e contratar mulheres, negras e periféricos”.
A representação da Mulher no Cinema
Outro assunto debatido foi a forma como a mulher é representada na telona, geralmente repleta de estereótipos de gênero, objetificando o corpo de forma sexualizada. As palestrantes lembraram da pesquisa Investigação sobre o Impacto da representação de gênero no cinema e na televisão brasileira, divulgado em 2016 pelo Instituto Geena Davis, que tem como objetivo ampliar a participação da mulher no audiovisual.
Cerca de 73% dos brasileiros acreditam que filmes e programas televisivos mostram as mulheres de maneira exageradamente sexualizadas e que mais da metade dos brasileiros acredita que os filmes e programas incentivam o desrespeito e o assédio a mulheres.
A atriz Britt Harris falou que ainda é mais fácil conseguir se posicionar no mercado como atriz do que trabalhar atrás das câmeras, e conseguir reconhecimento. Ainda assim, há as dificuldades de se sobreviver como atriz nesse universo. Britt também ressaltou de que é preciso pensar em como quebrar os estereótipos: “É preciso parar de chamar o negro para fazer o papel do negro. É preciso parar de chamar mulheres apenas para fazer o papel já conhecido de mulheres”.
Andrea Capella contou que tenta fugir dos estereótipos ao retratar o corpo feminino. “Sempre tento fazer uma luz que expresse relação não objetificação, nada de câmera lenta subindo do pé. É preciso ficar muito atento em como fotografamos esses corpos para não maximizar as questões de gênero”.
Ainda foram ressaltadas questões de formação de público, da necessidade de projetos ainda nas escolas, da democratização das mídias e principalmente a importância de ceder espaço e oportunidade para que as mulheres ocupem seus espaços.
Ilda Santiago, sócia do Grupo Estação e diretora do Festival do Rio, esteve na Academia Internacional de Cinema (AIC) do Rio de Janeiro, no último dia 3, participando da Semana de Cinema e Mercado (SCM), tradicional evento da escola.
Ilda confessou estar imersa no processo (quase) final da seleção da Première Brasil, uma das mostras mais esperadas e concorridas do festival, vendo vários filmes no dia, mas, que estava muito feliz de estar na AIC para conversar um pouco sobre cinema e festivais.
Circuito Estação
Começou contando um pouco de como surgiu o Grupo Estação, na década de 1980, com a vontade de exibir filmes independentes. “A gente queria trazer a experiência que tínhamos com cineclube para um formato mais profissional”, conta.
A história começou com a sala de Botafogo e o primeiro filme exibido foi “Eu Sei Que Vou Te Amar”, de Arnaldo Jabor. Hoje o grupo conta com 17 salas especialistas na exibição do circuito independente.
Festival do Rio
Ilda trouxe um pouco dos bastidores do Festival do Rio. Contou curiosidades, falou sobre as seleções e principalmente sobre o trabalho duro escondido atrás do glamour.
Contou como tudo começou, com o FestRio em 1987. Um ano depois nascia a Primeira Mostra Palco Nacional, patrocinada pelo extinto Banco Nacional. Em sua primeira edição a Mostra trouxe 30 estreias e se manteve por 10 anos. Em 1997 virou Mostra Rio e o atual nome só apareceu em 1999, junto com a ideia de difundir mais o Cinema Brasileiro e Latino.
Na primeira Première Brasil foram exibidos apenas 7 filmes, hoje, são mais de 60 entre curtas e longas. “A ideia da première sempre foi criar impacto e quebrar moldes pré-estabelecidos. Não é fácil manter uma linha consistente, abraçar a diversidade e ao mesmo tempo pensar no mercado”, conta.
Ilda contou que a seleção dos filmes começa no Ventana-Sur, em Buenos Aires, entre novembro e dezembro. É lá que ela começa a pensar nos filmes do ano seguinte. Depois dele, mais tantos outros festivais.
Também contou um pouco da sua rotina de cinéfila. “Acordo às 6h para ver o primeiro filme do dia. São no mínimo dois por dia. Um de manhã e outro à noite. Final de semana então, nem saio de casa, sento no sofá na sexta e só saio de lá na segunda”.
Filme Defeituosos e Filmes de TV
Ilda também defendeu os filmes ruins: “amo ver filmes defeituosos”, comentou, dizendo que eles são importantes para a formação de qualquer curador ou cineasta. Também falou da importância dos filmes feitos para a televisão. “Acho que não podemos usar o termo de uma forma pejorativa, dizer que o filme foi feito para TV tem a ver com o tempo do filme, com o olhar. Não com ele ser ruim ou bom. Sem contar que a televisão formou alguns dos grandes diretores do nosso cinema. Então, como falar mal dela? ”, comenta.
Para finalizar Ilda disse que o mais importante para ela é manter as pessoas indo ao cinema, sempre. Ela acredita que para que aja mais equilíbrio é preciso que exista investimento em todos os setores, se referindo a importância de ter dinheiro para promover o filme depois de pronto. “Quero que os filmes que eu acredito consigam entrar no mercado”.
Agora só esperar (ansiosamente) pelo Festival do Rio 2017, que acontece em outubro.
O segundo dia da já tradicional Semana de Cinema e Mercado (SCM) da Academia Internacional de Cinema (AIC), em São Paulo, contou com a participação do produtor Caio Gullane. Especialista em desenvolvimento de projetos artísticos, planejamento e estratégia de produção, com mais de 60 projetos de sucesso na carreira, Caio agraciou os alunos e convidados com uma verdadeira “aula” sobre mercado cinematográfico e gestão. Começou sua fala afirmando “Vocês são muito sortudos”, referindo-se ao excelente momento do mercado audiovisual, principalmente em relação as oportunidades e as políticas públicas.
“É a melhor fase para começar no audiovisual pois a produção de conteúdo está em todo o lugar, além do cinema temos a televisão, a internet, o celular, o VOD, a publicidade etc”. Deixe seu e-mail e Receba…
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O Mercado que a crise não afetou
Mesmo com toda a crise econômica, Caio trouxe dados que comprovam que a crise não chegou no mercado audiovisual. Em 2016 foram 184,3 milhões de bilhetes vendidos e uma receita de R$ 2,6 bilhões, representando que o mercado cresce pelo oitavo ano consecutivo.
“Mesmo com o crescimento, nossa plateia ainda está se formando, ainda não tem o hábito do cinema, o que é uma oportunidade pois é isso que garante esse crescimento ano a ano. E apesar da crise, do preço do ingresso, o cinema ainda é uma alternativa barata de lazer, se comparar com uma viagem, um show ou uma festa”, defende Caio.
O mercado é promissor, mas, segundo ele, há um problema, que, dependendo do olhar, pode ser visto como uma oportunidade. O Market-share de filmes brasileiros, ou seja, a proporção de filmes nacionais em relação ao total de ingressos vendidos ainda é baixa, cerca de 15% em 2016. Mesmo sendo baixo, também é um dado que apresenta crescimento nas pesquisas ano após ano.
“A briga é dura. Não é fácil lutar e competir com Batman, Homem-Aranha e Mulher Maravilha”, brinca.
Em 2016 foram 143 longas-metragens brasileiros lançados, contra 130 em 2015. “Em resumo o cenário e muito positivo e promete crescer ainda mais”, comenta.
Ele também lembra o porquê de as comédias brasileiras serem recordistas de audiência: por se assemelharem a linguagem da teledramaturgia, tão familiar ao público.
Caio finaliza o papo sobre mercado lembrando da importância das políticas públicas, da Ancine, do Fundo Setorial e da organização que o setor vive. Para ele, a lei 12.485 foi sancionada graças a união e organização do setor. “Conseguimos através de uma política e trabalho sérios a criação da Lei da TV Paga, em 2011, que possibilitou que os canais pagos obrigatoriamente exibam e produzam conteúdo nacional independente, não apenas programação pronta trazida de fora”.
Trajetória
“Quando ainda estávamos começando e o cinema ainda não vivia sua retomada, Luiz Bolognesi comentou comigo: cara eu preciso escrever. Quando ele começou, apesar de ser roteirista, escrevia de tudo, chegou a escrever bula de remédio. E de uma certa forma isso foi bom para ele pois desenvolveu um poder de concisão enorme que é absolutamente necessário na escrita de um roteiro”.
Caio conta a história do amigo para relembrar que a sua foi parecida. Também fazia de tudo um pouco e não perdia oportunidades, se inscreviam em editais de curtas e se dedicavam muito em tudo que fizeram.
“Nos tornamos uma dupla de produtores muito solicitada, mas antes de abrir efetivamente a Gullane, fizemos muito freelance e demos o sangue por muito projeto. Aos poucos fomos percebendo que algumas etapas da produção podiam ser um pouco melhores, e que isso permeava todas as produtoras, a partir daí, desse ‘vácuo’ começamos a criar a nossa filosofia sobre como fazer as coisas, e começou a surgir o conceito da Gullane. Acho que o sucesso foi uma questão de dedicação, sorte, talento, mas foi também uma questão estatística e matemática”, conta.
Caio lembrou quando a Laís Bodanzky e Luiz Bolognesi os chamaram para produzir “Bicho de 7 Cabeças” e, de cara, pensaram em chamar Sara Silveira, pela sua experiência sobre financiamento (captação) e como essa decisão foi essencial para conseguir produzir o filme.
Equipe de Cinema, Etapas de Produção e a Gestão de todo o processo
Depois de explicar sobre as principais funções do cinema e suas subdivisões, ressaltou, assim como Laís Bodanzky, na palestra de abertura da SCM, que nem sempre o profissional mais gabaritado e caro é o melhor para determinado projeto.
“Antes de sair contratando é preciso ter uma visão do todo e chamar o profissional que seja adequado artisticamente a dimensão do projeto pois se isso não for previsto, na hora do set surgirão problemas, terão conflito e isso aparecerá na tela. O equilíbrio é muito importante e o produtor tem que dar esse equilíbrio”, conta.
Talvez, dentre tudo que foi dito, a questão da gestão foi a que teve maior peso. Para Caio, para qualquer projeto ou filme dar certo, tem que existir a mesma estrutura de uma empresa. Tem que ter um financeiro, um gerente, pessoas especialistas em negócio, não apenas em cinema. E sobretudo, um bom desenvolvimento do projeto na pré-produção.
Talvez a citação mais forte, para reflexão, que ressalta toda essa questão de organização e gestão, que Caio tão bem falou é: “Se a gente quer ser indústria a gente precisa se comportar e se organizar como indústria”.
Ontem teve início a Semana de Cinema e Mercado na Academia Internacional de Cinema (AIC) do Rio de Janeiro. Com mediação do crítico Juliano Gomes, o diretor e montador Fellipe Barbosa e a assistente de direção e produtora Clara Linhart contaram sobre o processo, da criação a finalização, do filme ainda inédito “Gabriel e a Montanha”, com previsão de estreia brasileira em novembro.
Diferente do premiado “Casa Grande” (2015), “Gabriel e a Montanha” conta a história do economista Gabriel Buchmann, que resolve viajar pelo mundo antes de ingressar em seu curso de doutorado sobre políticas públicas para países pobres, na Universidade da Califórnia. Depois de percorrer alguns países da África, Gabriel foi encontrado morto, por hipotermia, no Malauí, após escalar o Monte Mulanje.
Gabriel e Fellipe eram amigos desde os 7 anos. Estudaram no tradicional colégio carioca São Bento e chegaram a cursar juntos economia, na PUC do Rio. Se distanciaram quando Fellipe foi para os Estados Unidos estudar cinema.
O filme, rodado na África, conta o final da viagem de Gabriel, os últimos 70 dias de sua jornada por quatro dos países que passou: Tanzânia, Quênia, Zâmbia e Malauí. A história mostra o ponto de vista de personagens reais, que cruzaram o caminho de Gabriel durante sua viagem.
Pesquisa e Roteiro
Fellipe decidiu contar a história em 2011, dois anos após a morte do amigo. Foi à África pela primeira vez para percorrer geograficamente o caminho de Gabriel. Desde então iniciou sua pesquisa e começou a escrever o roteiro, que só terminou em 2016. Na segunda viagem, em 2015, está com Clara e a produtora local, se concentraram em encontrar as pessoas que cruzaram o caminho de Gabriel e os locais que ele morou. A partir disso reescreveu o roteiro.
Caminhão de 16 lugares usado para transportar a equipe pela África
Enquanto isso Clara Linhart também corria atrás de coisas práticas, como a forma que a equipe viajaria pelos países. Foi quando a produtora africana, Vincho Nchogu, lhe apresentou um tipo de caminhão, que cabiam 16 pessoas, usado geralmente por turistas. Foi aí que a equipe se delimitou, seria composta por apenas 14 pessoas (quem sabe o tamanho enorme de equipes de cinema entende quão reduzida foi a equipe), já que 2 lugares seriam ocupados pelos atores João Pedro Zappa (que faz o Gabriel) e Carolina Abras (que interpreta a namorada de Gabriel, que foi visita-lo na África).
“Além dos depoimentos das pessoas que conheceram Gabriel, usei as suas fotos, que estavam na câmera encontrada perto do seu corpo, seu diário de viagem e os e-mails que ele mandava para a família e a namorada”, conta o diretor.
Rodando o Filme
A produtora e assistente de direção, Clara Linhart.
As filmagens aconteceram em exatos 53 dias, entre os meses de maio e julho de 2016. Para isso a equipe viajou pelos 4 países, percorrendo 6 mil quilômetros. Durante o bate-papo eles contaram sobre as diferenças de filmar em outro país e sobre as escolhas, algumas conscientes e outras tantas possíveis, que encararam durante o percurso e as filmagens.
“Rodei quase todo o filme em tripé, o filme tem apenas duas sequências com a câmera na mão. Eu queria imprimir a mesma pureza que Gabriel tentava encontrar em sua busca. A forma de registrar tinha que ser pura, como a busca do personagem”, conta Fellipe.
O diretor também falou sobre o trabalho com os não atores, disse que sempre dava liberdade para que eles fossem eles mesmos. Já com os atores profissionais, João e Carolina, Fellipe ensaiou bastante ainda no Rio de Janeiro, o que trouxe segurança para que eles improvisassem e também trouxessem frescor para as cenas. “Não costumo filmar passando o texto com o ator. E nesse caso em específico eu acreditava que a própria jornada iria transformá-los e isso realmente aconteceu”, conta.
Clara arrancou risos da plateia quando contou sobre o caos que virou seu trabalho como assistente. “No início eu tinha computador, impressora, cartucho e papel. Imprimia as ordens do dia, tinha cronogramas. No segundo país que visitamos já não encontrei mais cartucho para a impressora, não existia o cartucho por lá e tive que aposentar a impressora. Passei a fazer tudo a mão, fotografar e mandar por WhatsApp. Depois o computador pifou e as ordens do dia começaram a sair por escrito mesmo, no papelzinho”.
Festival de Cannes
Único representante brasileiro na Semana de Crítica deste ano, o filme ganhou dois prêmios: o de Revelação e o Prêmio da Fundação Gan, uma ajuda financeira para que o filme seja distribuído na França.
O longa, realizado com 60% de incentivo brasileiro, é uma coprodução francesa e estreia primeiro na França, no próximo dia 31, o que causou revolta entre os participantes do bate-papo, já que o filme só chega nas telas brasileiras em novembro.
“Também fico revoltado, mas, infelizmente, lá existe outra cultura e os nossos filmes, muitas vezes, são mais bem recebidos e assistidos lá do que aqui no Brasil. É triste, mas é a realidade. Quando acabou a exibição lá em Cannes, 70 donos de sala vieram falar conosco pois queriam os filmes nas salas deles. Aqui isso não acontece. Além de termos bem menos salas do que na França, se considerarmos o tamanho do nosso país, são poucas as salas que exibem esse tipo de filme”, diz Fellipe.
Ao final do bate-papo, perguntaram ao Fellipe se ele levará o filme para a África, para que as pessoas que o ajudaram e participaram das filmagens possam assistir o longa. Ele garantiu que em 2018 levará o filme para lá.
Melhor do que ouvir tudo que ele contou foi poder ver, em primeira mão, o plano sequência de cinco minutos que abre o filme. Pura poesia.
Começou ontem (1), em São Paulo, a 6ª edição da Semana de Cinema e Mercado da Academia Internacional de Cinema (AIC). Quem abriu o evento foi a cineasta Laís Bodanzky, que conversou com os convidados sobre seu quarto longa-metragem, “Como Nossos Pais”, que estreia nos cinemas no próximo dia 31. Além de falar do novo filme, Laís contou sobre como iniciou sua carreira, revelou como trabalha e escolhe os atores de seus filmes, da importância do projeto Cine Mambembe para sua vida e muito mais…
Como Nossos Pais
O drama tem como protagonista Rosa (Maria Ribeiro), uma mulher que busca perfeição em todas as suas obrigações: como mãe, profissional, filha, esposa e amante. Filha de intelectuais dos anos 70 e mãe de duas meninas pré-adolescentes, ela se vê pressionada pelas duas gerações que exigem que ela seja engajada, moderna e onipresente, uma supermulher sem falhas e nem vontades próprias.
Tão representativo, já que se parece com a história de tantas mulheres modernas, o filme discute um tema atual e urgente, de uma geração que se exige e é exigida e oprimida até a exaustão. “O projeto nasceu há uns cinco anos. Tinha um desejo de falar sobre as mulheres da minha geração (…) eu acho que ser mulher é quase que sinônimo de viver sobre pressão. A verdadeira pressão não é essa explicita, que colocamos sobre nós mesmas, é uma pressão / opressão invisível, que acontece justamente quando não nos dão o devido valor, ou quando não nos dão atenção, quando colocam a mulher nesse lugar, que é a margem, com certo desprezo. Isso é o mais terrível para nós mulheres”, diz Laís.
Com um orçamento aproximado de 7 milhões, produção da Gullane e Buriti Filmes, coprodução da Globo Filmes e distribuição da Imovision, o longa captou 100% do filme em diversos editais e outros instrumentos. Foi selecionado para a Mostra Panorama Especial no 67ª Festival de Berlim e premiado no 19º Festival de Cinema Brasileiro de Paris. Confira o trailer aqui.
É preciso entender a solidão do ator para conseguir dirigi-lo
Laís contou que sua experiência como atriz a ajudou a entender a solidão que o ator sente quando está no palco ou entre câmeras e equipe de filmagem. Falou sobre a impossibilidade de o ator dissociar o trabalho do próprio corpo, que é seu instrumento de trabalho e da importância do diretor ser um porto-seguro para o ator.
“Sempre escolho atores que me possibilitem trocar, atores criadores. E sempre ensaio muito com eles para criar intimidade. Também acho que o ator pode ter suas ‘frescuras’, é um direito dele e a equipe tem que respeitar o processo dele, pois só o ator está na frente da câmera, só ele coloca o corpo, só ele vai ser apontado na rua, o resto da equipe está escondida, então tem que respeitar o ator, o processo do ator”, defende.
Ao ser questionada sobre como escolhe os atores, Laís revelou que jamais escolheu um ator pensando no mercado, no ator que está em voga, ou que ajudará no lançamento. “Sinceramente acho isso um equívoco. Não basta ter o ator famoso, a gente precisa ter o ator certo para o personagem certo e para isso acontecer muitos fatores precisam combinar entre si. Não existe uma formula na hora de escolher, às vezes escolho porque me apaixono por eles ainda na fase da escrita, às vezes busco o ator que já tenha a essência que a personagem precisa. Às vezes é uma expressão, um jeito de falar, uma maneira de pensar, uma experiência da vida, cada um tem uma coisa. Por isso quando estou no processo de escolha do elenco, eu tento conversar com os atores, conhecer quem é a pessoa. ”
Laís diz não acreditar que o ator seja uma tela em branco onde podemos construir o que quiser, mas que ele é uma tela que já vem com traços pré-definidos e quando o diretor sabe utilizar isso a seu favor o efeito é maravilhoso.
“Com o Rodrigo Santoro tive uma sintonia muito grande, a ponto de discutirmos a velocidade que ele ia acender o fósforo”, contou.
Como tudo começou e a importância de estudar cinema
Filha de cineasta, no início, Laís queria ser atriz. Estudou no Centro de Pesquisa Teatral do Antunes Filho, de onde traz muitas influencias. Foi ainda quando estudava atuação que percebeu que o que gostava mesmo era da concepção do espetáculo. Acabou na faculdade de cinema onde conheceu seus parceiros de trabalho, Caio e Fabiano Gullane e onde começou o projeto de cinema itinerante. “Bicho de sete cabeças foi o primeiro longa de todo mundo e todos fizeram com muito carinho, o que deixava o set muito leve, apesar da história ser ardida”.
Salientou que o mais importante de estudar cinema é achar seus pares. “Trabalhar com os melhores do mercado nem sempre é sinal de sucesso. Para mim, o que sempre funcionou bem foi trabalhar com pessoas do mesmo nível que o meu, pessoas talentosas que crescem juntas e onde possa haver diálogo sobre os processos”.
Cine Mambembe – O Cinema Descobre o Brasil
Em parceria com o roteirista Luiz Bolognesi, Laís rodou o interior do Brasil exibindo curtas-metragens brasileiros em praças públicas. Para ela, o cinema itinerante foi um divisor de águas importante. Observar como as diferentes experiências do público afetam a percepção dos filmes foi crucial para que compreendesse melhor seu processo de criação e entendesse como passar a mensagem que deseja.
“No começo do projeto a gente tinha só 8 curtas e projetava os mesmos filmes em cada cidade que passava. Era interessante perceber que cada cidade tinha seu filme preferido e o mesmo filme gerava diferentes debates. O que entendi é que a preferência estava ligada ao lugar, ao público, a identificação com determinado personagem ou história. É preciso ter empatia para dialogar com qualquer plateia”.
Laís brinca que ela e o Luis criaram o que chamam de efeito mambembe, que é quando a plateia se identifica com o filme. Quando o filme atinge seu público-alvo.
Filmes e nomes de música
Para finalizar perguntaram a Laís sobre seus filmes terem nomes de música como títulos.
“Não sei explicar porque, mas, a música me inspira, de fato. O único filme que não tem nome de música é ‘As Melhores Coisas do Mundo’, mas eu briguei até o fim para que se chamasse ‘Ovelha Negra’ (Risos) Mas não deu. Com ‘Bicho de Sete Cabeças’, estava vasculhando discos em casa, escutei a música e achei que casava muito bem com o filme, apesar de ter sido escrito com outro contexto. Em ‘Já Chega de Saudade’, inicialmente o filme chamava ‘União Fraterna’. O nome dava uma conotação de fraternidade estranha e quando estava fazendo a pesquisa das músicas do filme me deparei com uma versão linda do Rogério Duprat, achei perfeito”, conta.
Como nossos pais, por outro lado, foi o contrário, ela fez o filme inspirada no título da música, conta que já sabia do título antes de começar a fazer o filme. O filme não tinha a música, pois a letra dava outro contexto, mas ela precisava colocar para não ficar estranho e acabou surgindo a sugestão de usar apenas uma versão instrumental. “Temos a cena da personagem tocando a música no piano e para mim é uma das cenas mais bonitas e emocionantes do filme”.