Academia Internacional de Cinema (AIC)

O que o mercado exige: prática de set ou diploma?

O sonho de estudar cinema muitas vezes esbarra em uma dúvida recorrente: como saber se um curso é realmente prático ou apenas demonstrativo-teórico? A diferença entre assistir a alguém operar uma câmera e, de fato, vivenciar o processo completo de produção de um filme pode determinar o futuro de quem deseja construir carreira no audiovisual. 

O que significa, de fato, ser prático? 

Segundo o coordenador do Curso Técnico em Direção Cinematográfica da Academia Internacional de Cinema (AIC) Elzemann Neves, um curso de cinema só é realmente prático quando vai além da teoria e da demonstração: 

“Um curso prático aplica o pensamento cinematográfico ao fazer cinema, com exercícios que estimulam o pensamento, ensinam a traduzir o pensamento em matéria concreta, som e imagem, luz e câmera. Faz o estudante pensar e executar todo o processo: a ideia, o roteiro, a produção, o set e a finalização.” Essa vivência prepara o estudante não só para criar, mas também para lidar com as pressões de um set real, onde cada minuto conta e decisões precisam ser tomadas rapidamente. 

O perigo da formação apenas demonstrativa 

Cursos que se vendem como práticos, mas oferecem apenas aulas demonstrativas, deixam lacunas. O estudante acompanha os processos, mas não sente a pressão nem a responsabilidade de realizá-los. 

“O maior risco é entrar no set sem preparo. Só assistindo — sem atuar — o aluno não aprende a hierarquia, os prazos, a urgência e a coordenação entre departamentos. Acaba subestimando o valor da pontualidade, da escuta, da flexibilidade — e isso pode comprometer todo o cronograma de uma filmagem”, alerta Elzemann. 

Estrutura que faz diferença 

Infraestrutura não é detalhe: é condição para a prática. Um curso completo precisa de ilha de edição, equipamentos de câmera, som, luz e um estúdio. Mas, além disso, o espaço físico influencia diretamente o aprendizado. 

“O casarão da AIC é mais que cenário: é um laboratório. As salas iluminadas pela luz natural servem de locação para cenas com composição realista; o jardim vira palco para ensaios dos alunos do Curso Técnico em Atuação para Cinema e TV; os corredores e escadarias desafiam a experimentar planos e movimentos. Esse espaço próprio já é um personagem e traz dimensão e textura ao aprendizado — pensar em quadro se torna agir em quadro”, afirma Elzemann. 

O coordenador destaca ainda que a flexibilidade acadêmica permite estabelecer parcerias diretas com o mercado, aproximando o ambiente de ensino da realidade profissional. A AIC mantém convênios com locadoras como Cinecam, Elitecam e Bureau, responsáveis por fornecer equipamentos usados em produções nacionais. Há também estágios com a Gullane, parcerias com a Utimura — um dos maiores acervos de arte do Brasil — e colaborações com a Cinemateca Brasileira, entre outras instituições. “Essas conexões fazem com que os filmes produzidos aqui alcancem um grau de profissionalismo imenso”, completa. 

Colaboração entre áreas: o cinema é equipe 

O cinema é, essencialmente, coletivo. Por isso, um curso prático precisa integrar as áreas — direção, fotografia, arte, edição, som, atuação. 

“A compreensão de todas as funções, suas características e relevância se faz fundamental na formação de um cineasta. Desenvolver o vocabulário, observar as etapas e administrar as vontades só é possível quando se vivencia a integração entre áreas”, observa o coordenador. 

Essa vivência ensina a dialogar com a equipe, gerir expectativas e conduzir projetos sob pressão. 

Exemplos de interdisciplinaridade na prática 

Um exemplo dessa interdisciplinariedade que acontece diariamente nos corredores da AIC é a integração entre os cursos de Direção de Fotografia e Direção de Arte. Os alunos colocaram em cena um roteiro, sob orientação dos professores André Moncaio (fotografia) e Dicezar Leandro (arte), as turmas uniram esforços: a equipe de arte cuidou de cenário e figurino, enquanto a de fotografia trabalhou iluminação, lentes e enquadramentos. 

Saskia Pelzer, aluna de Direção de Arte, conta: “Foi incrível — aprendemos a pensar o layout, escolher cada peça, lidar com diferentes visões: quando ceder, quando impor. Trabalhar com a turma de fotografia foi colaborativo, houve cuidado mútuo. Ao final, saímos com uma cena para o portfólio.” 

Esse tipo de dinâmica mostra como os exercícios extrapolam a sala de aula e se aproximam das demandas reais de um set profissional.  

Do exercício ao portfólio 

No curso técnico Filmworks, os alunos realizam exercícios contínuos que vão de roteiros adaptados e criação de personagens a ensaios de mise-en-scène e curtas autorais. Esses projetos passam por bancas avaliadoras formadas por professores e profissionais do mercado e culminam no Filmworks Film Festival, festival interno e exclusivo da AIC. 

“O olhar de uma banca ajuda o aluno a pensar o filme por diferentes perspectivas. Não se trata de dizer se é bom ou ruim, mas de discutir premissas, possibilidades narrativas e critérios técnicos”, explica Elzemann. 

Assim, o estudante entende como funcionam os processos de avaliação em festivais e editais — experiência fundamental para quem deseja circular seus filmes no mercado. 

AIC Incubadora: do projeto à realização 

Para quem tem um projeto autoral, a Incubadora AIC – uma iniciativa que acontece para os alunos dos cursos técnicos e de formação, funciona como ponte entre a formação e o mercado. Estudantes e ex-alunos podem inscrevem ideias que são avaliadas por uma banca. Os selecionados apresentam em pitching e podem receber apoio em equipamentos, estrutura ou conexões com produtoras parceiras. 

Foi nesse contexto que surgiu, por exemplo, o clipe Se Isso Te Faz Feliz, dirigido por Laura Reis (ex-aluna), com participação de colegas da escola e parcerias externas. A iniciativa mostra como a incubadora amplia oportunidades e dá vida a projetos autorais. 

Comunidade que gera mercado 

O aprendizado prático também fortalece o senso de comunidade. Muitos alunos formam grupos e, ao sair da escola, fundam produtoras independentes. 

No início dos anos 2000, a chamada “Máfia do Pão de Queijo – como o grupo ficou conhecido na AIC”, formada por jovens mineiros, ingressou no Filmworks em São Paulo. Dessa turma pioneira saíram profissionais que até hoje atuam juntos no mercado. Mais recentemente, ex-alunos como Lucas Lyrio e Amanda Doria criaram a Barra3 Filmes, produtora responsável por projetos audiovisuais em diferentes formatos. 

Esses exemplos reforçam como a formação prática não só prepara para o mercado, mas também estimula redes colaborativas que se transformam em empreendimentos reais. 

Como escolher o caminho certo no cinema 

A diferença entre cursos práticos e cursos mais teóricos ou demonstrativo não é apenas metodológica — é de formação de perfil. Enquanto uma abordagem acadêmica privilegia pesquisa e reflexão, um curso prático coloca o aluno no set desde o primeiro dia, treinando-o para lidar com tempo, pressão, equipe e resultado. 

No fim das contas, não existe um único caminho válido. O importante é que cada aspirante a cineasta reflita: o que eu busco neste momento da minha trajetória? 

Mas há um consenso entre quem já está no mercado: nada substitui a vivência em set. É lá que se aprende a tomar decisões, a negociar visões criativas e a transformar ideias em imagens. E, quando essa experiência prática vem acompanhada de um diploma reconhecido (como no caso da AIC), o estudante leva para o mercado não apenas um portfólio consistente, mas também uma certificação de peso. 

Mais do que escolher entre diploma ou prática, o desafio é buscar formações que consigam unir as duas dimensões — porque, no cinema, a teoria faz mais sentido quando vira filme. 

*Texto Mônica Wojciechowski – Entrevista Elzemann Neves –  Foto de estudantes do Filmworks da Academia Internacional de Cinema por Raíssa Nashla

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